OS AUTORES CLÁSSICOS E OS DRUIDAS

Muitos foram os autores clássicos que mencionaram as práticas sagradas dos druidas nas suas obras. Apesar de ser necessário abordarmos estes legados como oriundos de povos distintos, muitas vezes inimigos, e que muito poderiam ter a acrescentar ou alterar à verdadeira prática, é um facto que estes registos são a base do corpo da doutrina druídica que subsiste actualmente. Os relatos que aqui apresentamos são apenas uma recolha parcial, uma vez que existem outros autores clássicos com observações pertinentes acerca do druidismo.

Júlio César (séc. I AEC)
César fala-nos dos druidas na sua obra De Bello Gallico (A Guerra das Gálias). É inquestionável o interesse desta obra do ponto de vista estratégico e militar, mas a credibilidade das passagens é amplamente discutida. Há a hipótese de algumas particularidades atribuídas aos druidas e à sua doutrina poderem ser uma invenção de Júlio César. É, no entanto, o mais amplo relato que chegou até nós sobre estes sacerdotes.

«Os primeiros [os druidas] ocupam-se das coisas divinas, presidem aos sacrifícios públicos e privados, tratam das práticas religiosas. Um grande número de jovens vem receber instrução junto deles, que são objecto de grande veneração. (…) A sua doutrina nasceu, pensa-se, na Britânia e foi daí trazida para a Gália. Hoje ainda, aqueles que querem ter um conhecimento mais profundo da doutrina vão geralmente instruir-se para lá. (…) Os druidas não costumam ir para a guerra nem pagar impostos como o resto dos Gauleses. São dispensados do serviço militar e ficam isentos de toda a espécie de encargos. Atraídos por tão grandes vantagens, muitos vêm espontaneamente seguir o seu ensinamento, mas muitos são-lhes mandados pelos pais ou parentes próximos. Aí decoram, ao que se diz, um grande número de versos. Por isso alguns permanecem durante vinte anos na escola. Eles consideram que a religião proíbe que esses ensinamentos sejam passados à escrita, enquanto que para o resto em geral, para as contas públicas e privadas, servem-se do alfabeto grego. Parece-me terem estabelecido essa prática por duas razões: porque não querem nem divulgar a sua doutrina, nem ver os seus alunos, confiando na escrita, negligenciar a memória. (…) O que tentam essencialmente incutir é que as almas não morrem mas passam, após a morte, de um corpo para outro. Esta crença parece-lhes particularmente propícia para estimular a coragem, ao suprimir o temor da morte. Também discutem muitíssimo sobre os astros e o seu movimento, sobre o tamanho do mundo e da terra, sobre a natureza das coisas, sobre a potência e o poder dos deuses imortais, e transmitem essas especulações à juventude. (…)

Servem-se do ofício dos druidas para esses sacrifícios [humanos]. De facto, pensam que o poder dos deuses imortais só pode ser apaziguado pagando a vida dum homem com a vida de outro homem. (…)

Todos os Gauleses pretendem descender de Dis Pater. É uma tradição que lhes foi transmitida pelos druidas. É por essa razão que medem o tempo pelo número de noites e não pelo de dias. (…)»*

* [Retirado de A Guerra das Gálias, Júlio César (tradução de Angelina Pires realizada a partir de uma edição em latim do séc. XVI), Edições Sílabo, Lisboa, 2004]

É de vincar que, de um ponto de vista académico, não há qualquer prova de que os druidas tenham praticado sacrifícios humanos. Esta poderá ter sido mais uma contribuição astuta do militar Júlio César como forma de justificar a invasão da Gália e obter o apoio do povo romano.

Plínio, o Velho (23 EC – 79 EC)
Em Naturalis Historia, manuscrito elaborado em 77 EC, Plínio aborda as ervas sagradas utilizadas pelos druidas e descreve o ritual de colheita das mesmas, temática abordada ao longo deste almanaque.

Marco Túlio Cícero (106 AEC – 43 AEC)
Em De Divinatione, Cícero fala de um homem com quem travou conhecimento pessoalmente, possivelmente um druida, e cujas particularidades seriam as seguintes:

«Este homem professava não apenas um conhecimento profundo do sistema da natureza, ao qual os gregos chamam fisiologia, mas também predizia eventos futuros, parcialmente através do augúrio e parcialmente através da conjectura.»

Pompónio Mela (séc. I EC)
Em De Chorographia, Pompónio Mela relata-nos:

«Eles [os Gauleses] têm uma eloquência muito própria e os druidas como mestres da sabedoria. Estes afirmam conhecer a magnitude e forma da terra e do mundo, o movimento do céu e das estrelas, e a vontade dos deuses. Eles ensinam de forma privada aos mais nobres, e por muito tempo, às vezes por vinte anos, numa gruta, ou em florestas inacessíveis. (…) Juntamente com os mortos, eles queimam e enterram objectos que lhes pertenceram enquanto vivos (…)»

Públio Cornélio Tácito (56 EC – 117 EC)
Este historiador romano fala-nos especificamente dos druidas na Grã-Bretanha e legou-nos um relato simultaneamente surpreendente e comovedor, aquando da invasão da Ilha de Mona:

«Ali na costa estava um exército, repleto de homens e armas, e as mulheres corriam para trás e para a frente à maneira das Fúrias, com vestes fúnebres, de cabelo desgrenhado e carregando tochas diante deles. Também os Druidas, que lançavam terríveis preces em seu redor, com as mãos erguidas para o céu, atingiam os soldados com assombro provocado por esta estranha visão; de modo que, como se os seus membros estivessem colados ao corpo, eles ofereciam os seus corpos imóveis aos ferimentos. Depois, pelas exortações dos seus líderes e pelo seu próprio encorajamento mútuo, para não terem medo de guerreiros efeminados e fanáticos, eles envergavam os estandartes, derrubavam os seus oponentes e envolviam-nos nas suas próprias fogueiras (…) Então, era colocada uma tropa de guarda sobre os vencidos e os seus bosques eram derrubados, os quais tinham sido consagrados às suas cruéis superstições; pois eles consideravam legítimo oferecer o sangue dos prisioneiros nos seus altares e consultar os deuses através das entranhas dos homens.»

Estrabão (63/64 AEC – 24 EC)
O filósofo, historiador e geógrafo grego deixou um legado de dezassete volumes que compõem a sua obra Geografia. Descreve o povo da Gália e a sua narração acerca dos druidas é muito semelhante à de Júlio César.

«E entre todos eles [os gauleses] existem três classes de veneração distinta; os Bardos, os Ovates e os Druidas. Os Bardos são cantores e poetas. Os Ovates são videntes e filósofos naturais; enquanto os Druidas, para além da filosofia natural, também estudam a filosofia moral. Os druidas são considerados os mais justos dos homens e, com base nisto, estão encarregues de decidir, não apenas acerca das disputas privadas, mas também das disputas públicas; de modo que, nos tempos antigos, eles arbitravam até casos de guerra e faziam os opositores parar quando estavam prestes a preparar-se para a batalha, bem como os casos de assassinato, em particular, que lhes eram também entregues para decisão. (…) Contudo, não apenas os druidas mas também outros, dizem que as almas dos homens, e também do universo, são indestrutíveis, embora tanto o fogo como a água prevaleçam sobre eles em determinadas alturas.»

Diodoro da Sicília (séc. I AEC)
Este historiador grego transmite-nos um registo muito semelhante ao de Estrabão:

«E há entre eles [os Gauleses] compositores de versos, a quem chamam Bardos; estes, cantando com instrumentos semelhantes a uma lira, aplaudem alguns, enquanto injuriam outros. Há também alguns filósofos e sacerdotes incomparavelmente estimados, a quem chamam Druidas. Eles têm também profetas, que são tidos em grande estima; e estes, através de augúrios e sacrifício das vítimas, predizem eventos futuros, e mantêm a população em completa submissão: e especialmente, quando deliberam acerca de assuntos actuais, praticam um estranho e inacreditável rito pois, havendo escolhido um homem para sacrifício, golpeiam-no com uma espada num local acima do diafragma; tendo a vítima caído, eles pressagiam, pela forma da sua queda, a contorção dos seus membros e o fluxo do sangue, o que poderá vir a acontecer, justificando tais coisas com uma antiga e duradoura celebração. Eles têm por hábito não realizar sacrifícios sem a presença de um filósofo – pois dizem que o agradecimento deverá ser oferecido aos deuses por homens familiarizados com a natureza divina e que tenham a mesma linguagem, e por isto eles acreditam ser necessário pedir por coisas boas, não apenas no que concerne à paz, mas também à guerra, não apenas para amigos, mas também inimigos – e, sobretudo, submeter-se a eles e aos compositores de versos. Frequentemente, durante as hostilidades, quando os exércitos se aproximam um do outro com espadas desembainhadas e lanças estendidas, estes homens precipitam-se entre eles e terminam essa disputa, domesticando-os como domesticariam animais selvagens.»

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